Registo de Conversão de Sociedade Pluripessoal em Unipessoal
Com a entrada em vigor do novo Código Comercial, aprovado por Decreto – Lei n.º 1/2022 de 25 de Maio (o “CCom”), retirou-se a obrigatoriedade de número mínimo de sócios/accionistas passando a ser possível que, com excepção das sociedades em nome colectivo de responsabilidade limitada, todos os outros tipos de sociedades sejam unipessoais.
A conversão de uma sociedade pluripessoal (com mais do que um sócio/accionista) em unipessoal (com sócio/accionista único) é um procedimento simples e sem burocracias. Efectivamente, o CCom estabelece apenas que a conversão em sociedade unipessoal “(…) efectua-se mediante declaração do sócio ou accionista único na qual manifeste a sua vontade de transformar a sociedade em sociedade unipessoal, podendo essa declaração constar do próprio documento que titule a cessão da participação social”, declaração esta que deve ter a assinatura do sócio ou accionista reconhecida notarialmente e registada junto da Conservatória do Registo das Entidades Legais (a “CREL”) (art. 259(2) e (3) do CCom).
No entanto, possivelmente por o CCom usar o termo “transformação em sociedade unipessoal” ao invés de conversão, a CREL passou a exigir que as sociedades que se tornam unipessoais passem por todo um processo de transformação de sociedade, processo este não só ilegitimo como oneroso para os investidores.
Efectivamente, a transformação das sociedades dá-se quando uma sociedade passa de um tipo de sociedade para outro – por exemplo, uma sociedade por quotas transforma-se em sociedade anónima - . Tornar-se unipessoal não é tecnicamente nem legalmente uma “transformação”. Por outro lado, como vimos acima, o CCom é claro sobre a formalidade exigida – sendo apenas necessária a declaração, por escrito com assinatura reconhecida notarialmente, do sócio/accionista único.
Para clarificar esta questão, o novo Regulamento do Registo das Entidades Legais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 1/2024 de 8 Março e que entrou em vigor a 8 de Março de 2024, veio expressamente estabelecer no seu artigo 14(3) que “[o] registo da conversão de uma sociedade pluripessoal para uma sociedade unipessoal, ou vice-versa, faz-se mediante declaração de sócio ou accionista na qual manifesta a sua vontade de converter a sociedade em unipessoal ou pluripessoal, com a assinatura do sócio ou accionista reconhecida notarialmente, não sendo exigido a alteração do contrato de sociedade nem as formalidades exigidas para transformação de sociedade” (negrito e sublinhado nosso).
Como se vê, quaisquer dúvidas que porventura pudessem ter sido criadas pelo CCom sobre as formalidades do registo da conversão de uma sociedade pluripessoal em unipessoal foram expressamente clarificadas com o Regulamento do Registo das Entidades Legais.
Não obstante, e lamentavelmente, a CREL continua a recusar-se a registar a conversão de uma sociedade pluripessoal em unipessoal sem os formalismos de um processo de transformação de sociedade.
A conduta da CREL, ao insistir na aplicação de formalidades próprias de processos de transformação societária — contra a letra expressa da lei e em clara violação do artigo 14(3) do Regulamento do Registo das Entidades Legais — constitui uma actuação ilegal, arbitrária e profundamente lesiva do ambiente de negócios. Esta exigência indevida não apenas contraria o quadro normativo vigente, como cria custos adicionais injustificados, atrasos significativos e incerteza jurídica para investidores nacionais e estrangeiros, com impacto negativo na confiança da segurança jurídica e no sistema de registo comercial moçambicano.
Importa, por isso, afirmar com clareza: os investidores não devem ser intimidados por exigências que carecem de base legal. O legislador foi inequívoco ao simplificar o processo de conversão para sociedade unipessoal e ao afastar qualquer necessidade de transformação societária ou de alteração do contrato de sociedade. O papel da CREL é aplicar a lei — não criar obstáculos onde o legislador expressamente os removeu.
A insistência em práticas ilegítimas deve ser firmemente repudiada, e os operadores económicos devem exigir o cumprimento rigoroso do quadro legal em vigor. A previsibilidade, a legalidade e a segurança jurídica são pilares essenciais para a competitividade do país. Cabe à CREL respeitar a lei, proteger os direitos dos investidores e contribuir para um ambiente de negócios saudável, transparente e funcional — não o contrário.